O setor vinícola de Portugal desempenha um papel crucial na economia do país, não apenas devido ao seu valor económico, mas também pelo seu papel social, contribuindo significativamente para a cultura e história portuguesa. Em 2021, o setor gerou aproximadamente 3000 milhões de euros de atividade económica, representando 2,68% do PIB nacional e gerando 168.832 empregos, o que equivale a 3,4% do total de emprego no país. Este setor notável apresenta um superavit comercial significativo, com 941.5 milhões de euros em exportações de vinho, ressaltando a sua importância estratégica para a economia portuguesa. Face a este panorama, o Regime Geral de Prevenção da Corrupção (RGPC), introduzido pelo Decreto-Lei n.º 109-E/2021, surge como um marco regulatório imprescindível, aplicável a entidades legais com sede ou filial em Portugal que empregam 50 ou mais trabalhadores, incluindo o setor vinícola. Este guia passo a passo visa oferecer uma leitura enriquecedora e útil aos empresários portugueses do setor vinícola, facilitando a conformidade com o RGPC e promovendo práticas de gestão de riscos empresariais eficazes.
O que é o RGPC?
O Regime Geral da Prevenção da Corrupção (RGPC) é uma normativa fundamental implementada em Portugal para combater a corrupção nas organizações. Este regulamento é aplicável a entidades legais com sede ou filiais em Portugal que tenham 50 ou mais trabalhadores, incluindo setores como o vinícola, que é significativo para a economia e cultura do país.
Principais Requisitos do RGPC
- Programa de Compliance: As entidades são obrigadas a adotar e implementar um programa de compliance que inclui um plano de prevenção de riscos, um código de conduta, um canal de denúncia e um programa de formação.
- Plano de Prevenção de Riscos (PPR): Deve cobrir todas as áreas da organização e ser revisto a cada três anos ou quando houver mudanças significativas na estrutura ou atividades da entidade.
- Código de Conduta: Estabelece princípios, valores e regras para a ética profissional, considerando a corrupção e infrações relacionadas.
- Canal de Denúncia: Deve estar em conformidade com a Diretiva da UE 2019/1937, que protégé os denunciantes que relatam violações da lei da UE.
- Formação: Todos os diretores e funcionários devem ser formados nas políticas e procedimentos para prevenir a corrupção e infrações relacionadas.
- Oficial de Compliance: Deve ser designado um responsável pelo controlo e aplicação do programa de compliance.
Impacto e Sanções
A não conformidade com o RGPC pode resultar em multas que variam de €1.000,00 a €44.891,81 para entidades legais e de €1.000,00 a €3.740,98 para indivíduos. O prazo para a implementação do programa de compliance é de um ano após a entrada em vigor do RGPC, com a possibilidade de imposição de multas a partir de 8 de junho de 2023. As pequenas e médias empresas (PMEs) têm um prazo estendido até 7 de junho de 2024 para a aplicação de multas. Este regime não só reforça a transparência e a integridade nas organizações, mas também promove uma cultura empresarial mais ética e responsável, essencial para setores de relevância nacional como o vinícola. A implementação eficaz do RGPC pode ajudar as vinícolas portuguesas a melhorar suas práticas de gestão de riscos e conformidade, fortalecendo assim sua posição no mercado global.
Impacto do RGPC no setor vinícola
A conformidade com o Regime Geral de Prevenção da Corrupção (RGPC) pode introduzir custos adicionais para os produtores e exportadores de vinho, o que poderia potencialmente afetar a competitividade do setor vinícola português. Estes custos adicionais podem originar-se da necessidade de implementar sistemas de controle e auditoria mais rigorosos, da formação de funcionários em práticas de compliance e da manutenção de um canal de denúncias eficaz, conforme exigido pelo RGPC.
A implementação destas medidas, embora essencial para garantir a transparência e reduzir os riscos de corrupção, requer investimentos iniciais significativos e despesas operacionais contínuas. Para as vinícolas, especialmente as de menor escala que já operam com margens limitadas, estes custos adicionais representam um desafio considerável. Por outro lado, a adesão rigorosa ao RGPC também pode trazer benefícios a longo prazo para as vinícolas portuguesas. A conformidade não só melhora a imagem e a credibilidade das empresas perante o mercado internacional, como também pode abrir portas para novas oportunidades de negócio em regiões que valorizam altos padrões de governança corporativa e transparência nas operações.
Medidas preventivas principais sob o RGPC
Programa de Conformidade
- Designação de um Oficial de Compliance: Cada entidade deve nomear um Oficial de Compliance responsável por garantir e controlar a aplicação do programa de conformidade.
- Plano de Prevenção de Riscos e Corrupção (PPR): O PPR deve identificar, analisar e classificar os riscos de corrupção e infrações relacionadas, incluindo medidas preventivas e corretivas.
- Código de Conduta: As entidades são obrigadas a estabelecer um Código de Conduta que delineia princípios, valores e regras para todos os diretores e funcionários sobre ética profissional e leis anticorrupção.
Canais de Denúncia e Formação de Funcionários
- Canais de Denúncia Internos e Externos: É imperativo que as entidades adotem canais de denúncia internos e externos para corrupção e infrações relacionadas, respondendo às denúncias de acordo com a Diretiva da UE 2019/1937.
- Formação de Funcionários: Programas de treinamento internos devem ser providenciados para todos os diretores e funcionários, para que compreendam e implementem políticas e procedimentos de prevenção à corrupção.
Avaliação e Atualização do Programa de Conformidade
- Mecanismos de Avaliação: Implementação de mecanismos de avaliação para o Programa de Conformidade, incluindo controlos para avaliar sua eficácia e promover melhorias.
- Revisão do PPR: O PPR deve ser revisto a cada três anos ou sempre que houver mudanças nas funções da entidade, na estrutura organizacional ou na estrutura corporativa que justifiquem uma revisão.
Estas medidas são essenciais para garantir que as vinícolas portuguesas não apenas cumpram com as exigências legais do RGPC, mas também promovam uma cultura de integridade e transparência, essenciais para a sustentabilidade e o sucesso no mercado global.
Implementação do RGPC nas vinícolas portuguesas
A reestruturação da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Alentejo (CCDR Alentejo) como instituto público de regime especial, integrado na administração indireta do Estado, proporciona um modelo de governação com autonomia legal, administrativa, financeira e patrimonial. Esta mudança estrutural é crucial para a implementação eficaz do Regime Geral de Prevenção da Corrupção (RGPC) nas vinícolas portuguesas, uma vez que permite uma gestão mais ágil e adaptada às necessidades específicas do setor vinícola.
Unidades Operacionais e de Apoio Orgânico
A nova estrutura da CCDR Alentejo inclui Unidades Operacionais Orgânicas e Unidades de Apoio Orgânico, que são essenciais para a supervisão e implementação das diretrizes do RGPC nas vinícolas. Estas unidades são lideradas por diretores e diretores de gestão interina de 1º grau, que desempenham papéis fundamentais na orientação e no controlo das atividades de conformidade dentro do setor vinícola. Este modelo organizacional não só facilita a aplicação das normas de prevenção da corrupção, como também assegura que as medidas sejam adaptadas e relevantes para as vinícolas, contribuindo assim para uma cultura de integridade e transparência em toda a indústria. A autonomia concedida às unidades permite uma resposta mais rápida e eficiente aos desafios que surgem na implementação do RGPC, garantindo que as vinícolas possam aderir às regulamentações sem comprometer sua operacionalidade ou competitividade.
Desafios e soluções na adaptação ao RGPC
Desafios enfrentados pelas pequenas entidades
As pequenas entidades, com menos de 50 funcionários, enfrentam desafios específicos ao adaptar-se ao RGPC. Apesar de não estarem sujeitas aos mesmos requisitos rigorosos que as grandes empresas, estas entidades devem adotar medidas de prevenção à corrupção adequadas à sua dimensão e natureza funcional. Isso pode incluir a implementação de políticas simplificadas e sistemas de controlo interno proporcionais aos seus riscos e capacidades.
Estrutura e controles internos no Grupo TAP
O Grupo TAP, uma grande entidade que inclui várias empresas como a TAP – Transportes Aéreos Portugueses e a Portugália, destaca-se por seu compromisso em atingir a excelência na prevenção e combate à corrupção. A estrutura organizacional do grupo é um exemplo robusto, com uma clara distribuição de autoridade e responsabilidade, abrangendo desde o Conselho de Administração até comitês especializados como o de Auditoria e o de Conformidade. Além disso, o Grupo TAP estabeleceu múltiplos controlos para prevenir a corrupção, incluindo políticas como o Código de Conduta e a Política Anticorrupção, e ferramentas como um Manual de Compras e uma Política para o Canal de Conformidade.
Penalidades por não conformidade e período de adaptação
A adaptação ao RGPC é fundamental, pois a não conformidade pode resultar em penalidades significativas. As multas para entidades legais podem variar de €1.000,00 a €44.891,81, enquanto para indivíduos, as multas podem chegar a €3.740,98. Importante destacar que as pequenas e médias empresas têm um período adicional até 7 de junho de 2024 para se adaptarem, o que proporciona tempo adicional para ajustes e conformidade.
Estudos de caso
Caso Sogrape Vinhos
A tese intitulada “A indústria do vinho de Portugal e sua contribuição para os objetivos de desenvolvimento sustentável – ODS: o caso do Grupo Sogrape” explorou profundamente o impacto do Grupo Sogrape na sustentabilidade da indústria vinícola portuguesa. Focando nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável 8 e 12, o estudo destacou como a empresa integra práticas de trabalho decente e crescimento econômico, além de consumo e produção responsáveis. Este caso exemplifica a importância de adotar estratégias que alinham a produção vinícola com metas ambientais e sociais globais, reforçando o compromisso com a sustentabilidade.
Modelo ABQC na Quinta do Casal Branco
O estudo “The ABQC Model in the Wine Sector: A Case Study at Quinta do Casal Branco” demonstrou a eficácia do modelo ABQC (Activity-Based Quality Cost) na otimização dos processos de produção. Implementado na Quinta do Casal Branco, o modelo contribuiu para a melhoria significativa da eficiência no departamento de produção. Este caso revela como ferramentas de gestão de qualidade podem transformar operações produtivas, resultando em melhorias tangíveis na eficiência e na redução de custos.
Avaliação do Desempenho das Vinícolas
A análise de desempenho das vinícolas portuguesas, baseada em avaliações de vinhos pelo crítico João Paulo Martins, mostrou que a qualidade percebida do vinho é um fator determinante para o sucesso das empresas. A pesquisa utilizou uma amostra de 306 empresas vinícolas e 2567 vinhos avaliados, concluindo que a classificação média dos vinhos, o tamanho da empresa, o endividamento e a região são fatores que afetam significativamente o desempenho das empresas. Empresas com vinhos mais bem avaliados tendem a apresentar maior intensidade de exportação. Este estudo sublinha a correlação entre a qualidade do produto e o sucesso comercial no setor vinícola.
Considerações Finais
Ao longo deste artigo, procuramos abordar com profundidade e clareza os desafios e oportunidades apresentados pela implementação do Regime Geral de Prevenção da Corrupção no setor vinícola português, enfatizando não apenas a necessidade de conformidade regulatória, mas também os benefícios tangíveis que esta pode trazer em termos de reputação, eficiência operacional e acesso a novos mercados. As diretrizes apresentadas, juntamente com os estudos de caso e exemplos práticos, visam reforçar a importância de uma cultura empresarial pautada pela integridade, transparência e responsabilidade, valores essenciais para o sucesso sustentável neste setor tão vital para a economia e cultura de Portugal. Encerramos este guia com a confiança de que as vinícolas portuguesas estarão melhor equipadas para enfrentar os desafios de adaptação ao RGPC, beneficiando-se das estratégias e práticas recomendadas para uma gestão de riscos eficaz. A nossa intenção foi proporcionar uma leitura enriquecedora e de valor para os empresários do setor vinícola. Assim, põe-se em destaque a necessidade de uma contínua aposta na formação, inovação e adaptação às normativas legais, com vista a salvaguardar não apenas a conformidade, mas também a excelência e o prestígio que caracterizam os vinhos portugueses no panorama global.